quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Educação

Saí daquela sessão de cinema muito mais forte do que quando entrei. 'Nós somos o que fazemos', disse a protagonista de 'Educação' em determinado momento do filme. Tudo o que eu fiz na tarde de ontem foi sair mais cedo do trabalho para ir ao cinema. Eu sou aquilo que faço... No escuro do meu tempo, completamente só na sala 1 do Cine Bombril, as coisas vão ficando mais claras para mim. Com os olhos fixos na tela e a cuca mergulhada na história daquela menina audaz, enxergo um pouco mais sobre a minha alma. Meu nome não é Jenny, não sou uma inglesinha de 16 anos, não toco cello nem falo francês. Mas sei que somos o que fazemos.




E sei que para alcançar aquilo que escolhi fazer para 'fazer valer' a minha vida não há atalhos. E sabe de uma coisa? Tudo bem. É assim que alguém pode virar alguém de verdade, não é mesmo? Me vi sair daquela sessão, uma mulher de 27 anos, plenamente autônoma para seguir a trilha que fosse, desde que fosse de minha própria escolha. Olho para o chão e vejo que caminho com meus próprios pés. O presente está vivo. Enquanto caminho em direção ao estacionamento do Conjunto Nacional, a memória enaltece o passado que me educou. Nunca me esqueci daquilo que aprendi na rua: 'a escola da vida', como dizem por aí. Lembro dos mendigos com quem conversei, dos hippies com quem dividi cigarros, cervejas e histórias e que foram me assistir no teatro, conforme combinado na mesa do bar (coisa rara de se acontecer!), da família que morava na rua de quem me tornei amiga, do dia em que não os encontrei mais lá, daqueles que acudi por aí, por acaso, e, principalmente, dos outros tantos que deixei passar por mim sem fazer absolutamente nada para ajudar. Lembro de todos os porres que me fizeram esquecer o que fiz nas noites de tormenta, não lembro muito bem com quem estava quando não deveria estar, mas sei exatamente quem me puxou pelos braços quando chegava ao fundo do poço. As trepadas, os tropeços, os tragos... As tantas travessuras desmedidas que fizeram minha travessia... Sou aquilo que faço e também aquilo que fiz. Na minha memória está tudo aquilo que me fez. 'A escola não deve apenas nos ensinar, mas apontar o que é possível fazer com aquilo que nos ensina'. É o que Jenny diz à diretora de sua escola. Mas a verdade é que em algum momento sempre haverá algum professor que lhe abrirá janelas, portas, livros e caixinhas de música, ainda que a instituição em que lecione seja uma máquina bélica para enfrentar o vestibular. Não me esqueço destes professores incríveis que passaram pelo colégio e pela universidade que cursei. Enquanto faço a baliza para ir embora, que desta vez não esbarra no poste do estacionamento porque não estou embriagada como já estive outrora, nem penso em ligar o rádio. No silêncio da chuva que ainda cai sobre a cidade, penso na educação que recebi em meu núcleo famíliar. 'Quando chegar em casa e encontrar meus pais assistindo ao paredão do BBB, deitados na cama do quarto, vou gritar OBRIGADA! e fazer montinho neles!'. Sou aquilo que faço, que fiz e que fizeram por mim. Sou grata por enxergar o passado, por poder viver o presente e por não fazer a menor ideia do que acontecerá amanhã. 'Me sinto madura, sábia... jamais'.
Abaixo algumas frases ditas em casa, por ordem cronológica, todas são pilares da educação que recebi de meus pais:

'Ninguém é feio. Todo mundo tem algo de bonito. O cabelo da Priscila não é bonito? Então, diga isso a ela se um coleguinha disser que ela é feia. Porque ela é sua amiga e porque você acha o cabelo dela bonito'
'Não seja dedo-duro! É muito pior dedurar alguém do que fazer alguma coisa errada!'
'Compromisso é compromisso. Começou alguma atividade, vai levar a sério até o final!'
'O fato do garoto (meu namoradinho da praia, que era mais velho e estava sendo recriminado pelo meu pai - provavelmente porque eu tinha 13 e ele 17...) estar atrasado na escola não faz dele uma pessoa melhor ou pior. Ele é trabalhador. Trabalha num lava-rápido. E isso é muito digno para um garoto de 17 anos'
'Trate a moça da faxina com o mesmo respeito com que trata a diretora da escola. Elas poderiam ser sua mãe e por isso, você deve respeito a elas'
'Gentileza gera gentileza'
'Sobe agora, se olha no espelho e vê se se dá ao respeito!'
'Você vai terminar esta faculdade nem que seja por mim! Um dia vai me agradecer por isso'
'Nós te apoiamos'

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